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Cartas para Gui: Sobre o amor.


Victor -  Oi Gui, dia desses eu te segurei no colo e tentei te explicar a trama de Capitão Fantástico. Você ainda é um bebê, mas parecia bem impressionado com a sinopse. Enfim. Essa vai ser mais uma das cartas que eu e sua irmã vamos fazer para você. E essa é sobre amor. 


 Eu e sua irmã/segunda mãe/deusa estávamos conversando e chegamos na conclusão que um dia você vai sofrer por amor. E decidimos escrever isso aqui. Mas a grande verdade sobre o amor é que ele não corresponde a moral, nem a costumes, e que se manifesta de formas diferentes. Então, isso aqui pode te servir ou não. No amor o observador afeta o observado, e o observado quando é o amor, além de te observar às vezes também enfia os dedos nos seus olhos.


 Eu queria começar falando que amor não é uma coisa inteiramente boa, isto é, se tu considera as coisas boas e ruins. Muita gente tenta definir o amor, mas acabei chegando na conclusão que é algo que a gente vive. Acredito, pessoalmente, que amor é desejo; não carnal exclusivamente, mas o desejo no sentido de uma busca por uma coisa que te faz falta. Nós preenchemos essa falta de todas as formas. Por toda a história da humanidade nós fomos inspirados pelo amor. Amor a ciência, amor a alguém, amor aos pais.

 Amor também te causa abstinência, Gui. Acredite. Te faz falta, te estilhaça a alma, te quebra, te renova e te parte de novo. Amor também tem muita angústia. Tem boca seca e desejo não saciado. Ah, amor também se transforma! Isso é lindo. Amor se transforma. Sua irmã foi o meu primeiro amor, uma das formas dele (ah, o amor tem formas), e isso se transformou.

Meu bem, amar vai doer.


Se tu amar com intensidade, vai ser lindo, dolorido e caótico. Mas valer a pena.



Amar vai te arrancar os melhores sorrisos.



Amar vai te deixar vazio algum dia.



Elvis é uma ótima coisa para se ouvir quando sujeito ao amor.



Você pode sim amar alguém no primeiro momento que conhecer a pessoa.



Pode amar no último momento.



Ás vezes você tem escolha sobre o que ama.



 Ah, amor é respeito! Nossa, Gui, isso é importante. Tá, digamos que você entra em uma relação da sua escolha. Isso é importante! Você está em uma relação interpessoal, não em uma relação de poder. Então a sua parceira (o) não é sua propriedade, e você não tem direitos sobre a pessoa. Ela pode ir para onde quiser, vestir o que quiser, e assim vai. Ah. E diálogo! Nossa, isso é muito importante. Não tenta polarizar as coisas, estar certo. Conversa, todos os problemas se resolvem com conversa. Um apresenta um ponto, o outro apresenta outro ponto, e no fim chegam a uma conclusão.


Ah, é bem importante que você ouça Elvis quando apaixonado. Agora vou passar o microfone para a sua irmã. Um abraço. Tenho certeza que você é extraordinário.

Irina - Um dia o Guilherme vai sofrer por amar alguém.

Um dia o Guilherme vai sofrer por amar alguém.

É óbvio que eu queria poder evitar isso, bem (eu te chamo de “bem” Guilherme), é minha reação imediata. Mas seria egoísmo, sabe? Pois amar algo/alguém tem muita coisa boa. E tem partes não tão boas. Você vai ver isso com o pai e a mãe. Eles se amam, embora não estejam demonstrando o tempo todo e às vezes pareça ser mais provável o contrário. Mas é assim mesmo, você vai ver.

Sofrer por amor também é inevitável, bem, pois, você sabe… sempre há a possibilidade de sofrer por amar. Matematicamente, a probabilidade do sofrimento existe tanto quanto a da felicidade plena. Ela está lá, alguns de nós é que ignoram. Parece mais fácil assim.

Na verdade, o sofrimento é intrínseco ao ato de amar. Uma mãe sofre por um filho justamente pelo amor incondicional que tem por ele. A possibilidade de perder alguém é tão esmagadora quanto maior é o amor que se sente. Os filmes protagonizados por cães e seus donos são tão doídos pelo amor que expressam. “Quantos segredos têm as estrelas? Choro por saber que nunca irei descobri-los.”: há amor aí. E sofrimento.

“O ato de amar”, eu falei. Para mim é uma ação. “Amar... verbo intransitivo.” Amar é escolher se portar amavelmente, tirei isso de um livro, pois faz muito sentido na minha cabeça. Eu escolhi te amar, bem. Eu escolho te dedicar meu amor, meu tempo, meus cuidados, minha energia. E não quero nada em troca. Talvez os teus sorrisos banguelas (você ainda não tem dentes enquanto escrevo isso).

Bem, você vai sofrer por amar. Tudo o que posso fazer é te dar o colo e dizer que não é para sempre. E que vai passar ao mesmo tempo que sempre vai estar ali. E que não vai ser só uma vez. Serão tantas quantas você se permitir. E algumas vezes você tem que decidir não sofrer mais, seguindo adiante, por amor a você. Esse amor é lindo.

Bem, você vai sofrer por amar. Mas você vai, principalmente, amar. Ame, bem. Você. As pessoas que te fazem bem. As que te fazem mal. O seu cachorro. A mãe. O pai. Os manos. O que te deixa feliz. Os teus talentos. Os teus defeitos. A natureza. O mundo. Os teus semelhantes. O desconhecido e o novo. O que passou. O agora.

E me conta, bem, quando você estiver amando. E quando estiver sofrendo por amar. Vai ser lindo. E vai doer em nós. E vai passar, vamos sorrir.

Aliás, eu te amo, Guilherme.

Victor - Eu demorei para responder essa carta, mas hey, tua irmã é incrível né? Queria falar algumas cosias que tenho pensado e que esqueci de escrever aqui. Primeiro, Gui. As pessoas falam muito coisas como:

Se causa sofrimento não é amor.
Se não é feliz não é amor.

Agora, eu comecei a me perguntar: Por que as pessoas associam amor a felicidade? Lendo um livro do Clóvis de Barros filho cheguei em uma hipótese. O amor e a felicidade entram em um mesmo tipo de características, o que facilita a associação. Ambos são qualitativos e quantitativos, ou seja, tem intensidade e períodos de duração, e se transformam. E o que é interessante. Normalmente ambos tem como característica forte a ausência. Sempre estamos em busca do amor, em busca da felicidade. A busca caracteriza a falta de presença, a falta. O que proponho, Gui, é que o amor e a felicidade se unem pela falta. E isso não está errado (explico em outro carta). Agora, isso é bem importante. Você vai sentir falta das coisas. Ser, crescer, é sentir desejo. Desejo por milhares de coisas diferentes. Desejo de se encontrar, desejo dela, desejo dele, desejo de ficar sozinho, desejo de extrapolar, e por ai vai. Então, bem vindo a falta, meu bem.

Amor pode sim surgir de imediato, mas também existe o cativar. Vou falar um pouquinho sobre isso, mas se você ler O Pequeno príncipe vai ficar bem claro, super recomendo. Cativar significa criar laços, construir família (não só a sua, vai ver que existem outros tipos de família). Tu é eternamente responsável por aquilo que cativas. Mas algum dia talvez alguém que você ame vá embora, e tu encontre com ela na rua e simplesmente passe por ela. A responsabilidade está ali,, o cativar também, mas... Pessoas são estranhas.

Essa carta ficou bem grande, né? Se eu fosse resumir diria apenas: Ame.

Ame intensamente.
Ame da sua forma.
Ame.
Tenho certeza que vai ser... Extraordinário.



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